MORAL CADUCA (Fernando Bastos)

Na minha rua há um homem bom, honesto, íntegro
Vai à missa todo domingo e nunca esquece
de colocar umas notas na caixinha
Dá esmola na rua, doa roupas aos pobres, não fura a fila,
espera o pedestre atravessar a faixa,
devolve o troco a mais.
Mas o homem bom, honesto, íntegro
porque foi devidamente adestrado desde pequeno
tem estranhos entendimentos sobre a moral:
Ele odeia homossexual,
sambistas com pouca roupa no carnaval
universitária de saia curta
mulheres na praia de fio dental
e toda aquela gente que anda nua
em praias onde vai quem quer.
Por outro lado, esse homem bom, honesto, íntegro
não vê nada de mal e aplaude
rodeios, touradas, farras do boi
e farras do homem – onde gladiadores lutam
em pequenas arenas até ficarem desacordados
mesmo que isso esteja influenciando milhares de jovens
a repetir essa violência nas ruas.
Esse homem bom, honesto, íntegro
não consegue ver que ele foi enganado
por uma moral caduca, milenar, selvagem
que deprecia o belo, a sensualidade, o prazer e o nu
mas glorifica o ódio às minorias, exalta as superstições
rechaça o pensamento livre, treme de medo da dúvida
e de perguntas.

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